5 de fevereiro de 2022

Muita FOMO de ganhar

Significado de FOMO
Emoção e razão, são estes os dois principais motores que fazem mover qualquer atividade humana. Se estivessem a equipar um automóvel, diríamos que quando estamos a investir nos mercados de ações ou em criptomoedas, estaríamos a conduzir um híbrido, com o motor principal a combustão e poluente (sentimentos e emoções) a debitar a maior parte da potência, auxiliado por um pequeno motor elétrico (lógica e razão). 
Seriamos capazes de ganhar o Grande Prémio que todos perseguimos ?

Existe sempre uma forte probabilidade do primeiro motor, o das emoções, não nos levar muito longe. É contudo aquele que mais usamos principalmente pela facilidade no uso, pela ilusão de controlo que nos dá. Seria recomendável que estivéssemos bem conscientes do quão o nosso estado de espírito e as emoções podem guiar e influenciar as nossas decisões e do quão fatal isso pode ser para a nossa situação financeira.

Com o segundo motor, o da razão, o risco de "despiste" continua a existir, porque também toda e qualquer atividade humana acarreta risco. É uma espécie de Lei universal, é a lógica da natureza. Não podemos controlar tudo. Mesmo os sistemas mais perfeito são alvo de falhas. Contudo, seguindo a razão e controlando as nossas emoções, as probabilidades de sermos bem sucedidos aumenta exponencialmente em qualquer área, especialmente nos mercados. 

No mercado de ações, cujos bens transacionados são parcelas de propriedade de empresas, podemos, desde que possuamos os conhecimentos para tal, utilizar a razão a nosso favor, à luz de uma análise aos indicadores económicos, à saúde financeira da empresa, a evolução do seu crescimento  e perspectivar o seu futuro, atribuindo-se por isso, objetivamente, um valor às suas ações. 

O fator risco está contudo presente porque na realidade ninguém consegue prever o futuro. Se não sabemos o que nos poderá acontecer amanhã, que somos relativamente donos do nosso destino e controlamos as nossas ações ou reações, mais difícil se torna prever o futuro de uma empresa sobre não temos qualquer influência. A evolução tecnológica, a concorrência, sociedade, a própria falta de rigor da informação prestada por uma empresa cotada, são inúmeras as variáveis que podem condicionar aquilo que é o seu valor real e a cotação das suas ações. 

Mas se no mercado de ações os investidores têm onde "se agarrar", possuem matéria prima, informação à disposição para fazerem as suas análises fundamentais e tomar as suas decisões, porque também as empresas existem, são bens reais, tangíveis, no mercado das criptomoedas as coisas processam-se de maneira muito diferente. Não existem 'fundamentais' das criptomoedas, quanto muito, existem fundamentais das empresas e projetos que estão por detrás delas.

Quando trocamos o nosso dinheiro, chamemos-lhe real, porque existe um consenso real, objetivo, acerca do seu valor, por criptomoedas, onde o consenso é incomparavelmente mais subjetivo e restrito, estamos a adquirir algo que não fungível. Não estamos a adquirir parte da empresa ou projeto que está por detrás da criptomoeda ou da blockchain que aquela gere, e por conseguinte, parte dos seus lucros. Estamos tão somente a adquirir um produto sem existência física, portanto, não uma parte da empresa e do quinhão dos seus potenciais lucros.

O certo é que não obstante a ausências de dados fundamentais sobre as criptomoedas, a confiança nelas depositada e o volume de capital por detrás dessa confiança tem feito disparar o seus valor. Objetivamente uma criptomoeda tem somente o valor que os investidores acreditarem que tem não existindo a obrigatoriamente a necessidade de estar relacionada com fatores racionais e lógicos. As chamadas meme coins são um exemplo e prova desta realidade. Se há território onde as emoções estão mais divorciadas da razão, é portanto o mercado das criptomoedas. 

Tal não invalida que não se possa ganhar dinheiro, sendo certo que dificilmente estamos na presença de um jogo de soma positiva onde todos podem ganhar. Para que tal aconteça, para que alguém fique milionário, terá necessariamente de haver alguém a empobrecer... Havia um célebre proto candidato a presidente da república que prometia um Ferrari para cada português. Se dividíssemos toda a riqueza acumulada dos tais famosos 1%, por todos os restantes habitantes do planeta, muito provavelmente haveria dinheiro para comprar um Ferrarri para cada um. Mas aí, quem os fabricaria ? E qual seria a piada de toda a gente andar de Ferrari ? Gostamos de exclusividade, de nos diferenciarmos dos outros. Passa por aqui o insucesso do comunismo e do quão contranatura é essa ideologia. O sentir que temos algo que é desejável por muitos, dá-nos prazer. É também isso que nos faz levantar da cama todos os dias para irmos trabalhar e fabricar os Ferrari para outros...

Em certa medida um dos principais sentimentos ou emoções que conduzem o mercado das criptomoedas é a FOMO, acrónimo para Fear Of Missing Out, qualquer coisa como medo de estar a perder uma festa incrível onde montes de gente está a divertir-se e nós não. O termo foi cunhado numa alusão ao fenómeno das redes sociais. Bombardeados com imagens de momentos de (aparente) felicidade dos nossos amigos, conhecidos e pessoas que seguimos, podemos ser invadidos pela sensação de que estamos a perder algo... A vida está acontecer lá fora, está a ser vivida com intensidade, estão a ser criadas memórias, histórias e recordações, enquanto nós estamos frente a um écran, sozinhos, sentindo-nos ainda mais sozinhos porque era ali, naqueles fotos que gostaríamos de estar, a viver aquela realidade, aqueles momentos de êxtase que gostaríamos de experimentar.

O medo de que estejamos a perder algo de muito bom que os outros estão a experimentar, também se reflete no mundo das criptomoedas. É reconhecido que é um 'negócio' que já fez milhares e milhares de milionários e estes não se coíbem de partilhar as suas histórias, mostrar os seus "Lambos". E quando olhamos para essas pessoas, muitas vezes pensamos que até somos mais inteligentes, temos melhores características humanas que elas. Até éramos capazes de ajudar outros financeiramente, tão bonzinhos que somos, feitos que aquele malta nos iates, nos banhos de champanhe, parece ser incapaz de alcançar. Ora, se é nas bitcoins que eles enriquecem, é nas bitcoins que vamos enriquecer também! Nada mais errado! Guiados pela FOMO, mas também pela ganância, estes investidores, na expectativa de enriquecer, só estarão a enriquecer outros. Serão eles a comprar as bitcoins que outros já compraram muito antes e que agora têm quem as compre a preços muito superiores. Para se fazer um rico, é sempre preciso fazer ou manter muitos pobres ou remediados. As criptomoedas são uma forma perfeita deste eterno mecanismo de transferência de capital de muitos para poucos se perpetuar.